quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Entrevista com Glauber Rocha



Pergunta: Creio que isso é muito evidente n’A Idade da Terra: o prazer de filmar do cineasta. O que me conduz a uma pergunta: de que modo é que esse prazer do cineasta pode pôr em causa o prazer do próprio espectador?

Glauber
: O problema do espectador na obra de arte é um problema que eu não considero, digo-lhe isso com a maior sinceridade. Porque eu acredito que a obra de arte é um produto da loucura, no sentido em que fala o Fernando Pessoa, que fala o Erasmo, quer dizer, a loucura como a lucidez, a libertação do inconsciente. É por isso que eu não me considero um cineasta profissional, porque se o fosse teria que atuar segundo o ritual da indústria cinematográfica. Considero-me um amador, como o Buñuel, alguém que ama o cinema...

Pergunta: ...mas que não ama necessariamente os seus espectadores?

Glauber: Não é que não ama os espectadores, é que procura mostrar ao espectador o máximo possível do que se está a passar dentro dele. Naquele momento, não pode ter nenhuma censura. Então, o diálogo com o espectador é o diálogo da paixão humana, é um problema de sedução ou de guerra. Há uma disposição de se mostrar nu sem culpa.Aceito críticas ao meu cinema de toda a ordem – formal, artística, estilística, etc. – mas eu sei, sinceramente, humildemente, que meu cinema pode estar cheio de todos os defeitos, mas sei que não é um cinema reacionário, que não é um cinema antiprogressista, que não é um cinema anti-revolucionário. É um cinema muito identificado com as necessidades transformadoras.Então, digo sempre: quero conquistar o público, mas não quero explorar o público. Depois, a minha prática cinematográfica permitiu-me, até hoje, sobreviver fazendo os filmes que faço. Quer dizer, o sujeito tem a cara dos filmes que faz, como se diz “tem a cara da vida que leva”. Então prefiro um diálogo com o público a níveis não convencionais, porque os filmes não estão dentro de um aparato convencional. Não lhe posso responder de uma forma diferente, porque seria uma forma pretensiosa.A forma de meu cinema, com todos os altos e baixos, com todos os pontos brilhantes e obscuros, com tudo o que tem de feio e de bonito, é a expressão da minha personalidade. Então, assumo meu ego, mas não de um ponto de vista narcisista ou individualista, mas de um ponto de vista órfico, no sentido de não tentar mudar o mundo, mas, como Orfeu, tentar criar um novo mundo audiovisual. Se eu criei condições históricas e econômicas para produzir um tipo de filme segundo a minha pulsão (que é a única forma de sobreviver) tenho que assumir os riscos da incompreensão – isso para mim faz parte do jogo dramático da cultura.

Pergunta: Um filme sem pé nem cabeça. Essa é uma das críticas que se faz a seu filme. Afinal, o que é “A Idade da Terra”?
Glauber: Uma obra de arte não se explica. Um poema você lê e sente. Um quadro você vê. Filme que se explica é filme que tem história para contar. Seria cabotino eu tentar explicar o filme, se ele é colocado como um corpo novo, um objeto não identificado. Trata-se de novas visões, captações até metafísicas que marcam uma revolução na minha obra. Do filme “Di Cavalcanti” para cá, rompi com o cinema tetaral e ficcional que fiz de “Barravento” até “Claro”.“A Idade da Terra” é a desintegração da seqüência narrativa sem a perda do discurso infra-estrutural que vai materializar os signos mais representativos do Terceiro Mundo, ou seja: o imperialismo, as forças negras, os índios massacrados, o catolicismo popular, o militarismo revolucionário, o terrorismo urbano, a prostituição da alta burguesia, a rebelião da mulheres, as prostitutas que se transforma em santas, as santas em revolucionárias. Tudo isso está no filme dentro do grande cenário da História do Brasil e das três principais capitais, Bahia, Brasília e Rio. Trata-se de um filme que joga no futuro do Brasil, por meio da arte nova, com se fosse Villa-Lobos, Portinari, Di Cavalcanti e Picasso. O filme oferece uma sinfonia de sons e imagens ou uma anti-sinfonia que coloca os problemas fundamentais de fundo. A colocação do filme é uma só: é o meu retrato junto ao retrato do Brasil.

Do lindo site: http://www.interzona.spatum.net/

Clube da Luta


"Eu vejo aqui as pessoas mais fortes e inteligentes. Vejo todo esse potencial desperdiçado. A propaganda põe a gente pra correr atrás de carros e roupas. Trabalhar em empregos que odiamos para comprar merdas inúteis. Somos uma geração sem peso na história. Sem propósito ou lugar. Nós não temos uma Guerra Mundial. Nós não temos uma Grande Depressão. Nossa Guerra é a espiritual. Nossa Depressão, são nossas vidas. Fomos criados através da tv para acreditar que um dia seriamos milionários, estrelas do cinema ou astro do rock. Mas não somos. Aos poucos tomamos consciência do fato. E estamos muito, muito putos. Você não é o seu emprego. Nem quanto ganha ou quanto dinheiro tem no banco. Nem o carro que dirige. Nem o que tem dentro da sua carteira. Nem a porra do uniforme que veste. Você é a merda ambulante do Mundo que faz tudo pra chamar a atenção. Nós não somos especiais. Nós não somos uma beleza única. Nós somos da mesma matéria orgânica podre, como todo mundo" (Tyler Durden).

Factotum




Acabei de assistir a um novo filme, chamado Factotum, baseado na obra do Bukowski. Na última cena (que vale o filme todo) o personagem apresenta o seguinte poema:

"roll the dice"

if you’re going to try,
go all the way.
otherwise, don’t even start.
if you’re going to try, go all the way.
this could mean losing girlfriends, wives, relatives, jobs and maybe your mind.
go all the way.
it could mean not eating for 3 or 4 days.
it could mean freezing on a park bench.
it could mean jail, it could mean derision, mockery, isolation.
isolation is the gift, all the others are a test of your endurance,
of how much you really want to do it.
and you’ll do it despite rejection and the worst odds
and it will be better than anything else you can imagine.
if you’re going to try, go all the way.
there is no other feeling like that.
you will be alone with the gods
and the nights will flame with fire.
do it, do it, do it. do it.
all the way all the way.
you will ride life straight to perfect laughter,
it’s the only good fight there is.

charles bukowski

Bom agora vou cometer o pecado maior, vou tentar traduzir. Nesse fim de ano pedreira que estou vivendo, serve como presente de eu pra mim mesmo.

Role os dados

Se você vai tentar, vá fundo.
De outra maneira, nem comece.
Se você vai tentar, vá fundo.
Isso pode significar perder namoradas, esposas, parentes, empregos e até sua cabeça.
Vá fundo.
Pode significar ficar 3 ou 4 dias sem comer.
Pode significar congelar em um banco de praça.
Pode significar prisão, zombaria, escárnio, isolamento.
Isolamento é a dádiva.
Todos os outros são testes para a sua resistência,
do quanto realmente você deseja.
Se você vai fazer, apesar da rejeição e das piores chances contra
e vai ser melhor que
Qualquer coisa que você puder imaginar.
Se você vai tentar, vá fundo.
Não há nenhum sentimento como este.
Você vai estar sozinho com os deuses e
as noites vão arder com o fogo.
Faça. Faça. Faça. Faça.
Até o fundo, até o fundo.
Você vai conduzir a vida direto em direção à risada perfeita.
É o único bom combate que existe.

Dois perdidos numa noite suja

Eu entendo muito pouco de teatro. Devo ter ido a umas 10 ou 15 peças minha vida inteira. Atuei num grupo durante a infância. Depois adulto com um povo que tava mais preocupado com a loucura que com as técnicas teatrais. Ah, assisti como aluno ouvinte, meio semestre de uma matéria de dramaturgia no curso de teatro da nossa universidade estadual de santa catarina. Aprendi que a essência de uma peça está no conflito. Na verdade curto muito mais cinema. Nesse sim, mergulhei mais fundo. Principalmente como espectador. Embora tenha arriscado algumas coisas por detrás da câmeras. Hoje eu assisti a um filme, adaptado de uma peça: "Dois perdidos numa noite suja". Do Plínio Marcus. Direção do José Jofilly.
Interessante como a gente percebe que a estrutura essencial da peça ainda está lá. Nos cenários, no ritmo dos diálogos. Diria que é uma forma intermediária de arte. Embora não tenha assistido à peça original. É uma busca de linguagem interessante. O Plínio parece ser um cara bem ousado, nos temas e na expressão. Principalmente considerando que a peça é de 1966. Mas isso que é bacana na arte, quando faz a gente pensar, quando gera aquele desconforto que a gente começa a achar a cadeira dura e se mexe e tira a bunda do lugar. A confusão da questão do gênero, a luta pela sobrevivência em contaponto ao sonho, a violência, a prostituição e a arte, tudo isso faz parte do conflito proposto pelo autor.

Eu gostei. Tem momentos que fica cansativo e a expressão do teatro que é sempre mais exagerada, incomoda diante das câmera. Mas vale assistir. E para quem não entende muito de teatro, uma bela chance de aprender mais um pouco.